O PSDB, um dos partidos que deseja se apresentar como uma espécie de “terceira via”, está em vias de realizar suas prévias para a escolha de seu presidenciável para 2022. Mas entra neste processo de debates internos com fissuras cada vez maiores que vêm sendo abertas desde 2017 e fazendo com que a legenda tucana esteja em um processo de crise quase que permanente.
Desde a sua fundação em 1988, a sigla tem muito das suas decisões influenciadas pelo diretório de São Paulo, das diretrizes internas até a escolha dos presidenciáveis: em 1989, o paulista Mário Covas foi o candidato tucano; em 1994 e 1998, embora fosse na primeira eleição o candidato apoiado pelo Planalto e na segunda concorresse a reeleição, Fernando Henrique Cardoso era oriundo de São Paulo, escolhendo para sua sucessão em 2002 outro paulista, José Serra; em 2006 e 2010, os Governadores de São Paulo Geraldo Alckmin e José Serra foram os presidenciáveis.
A eleição de 2014 foi a única onde um não-paulista foi o presidenciável do PSDB: o ex-governador de Minas Gerais e então senador Aécio Neves. O bom desempenho de Neves acabou sendo um divisor de águas que acaba sendo um dos principais combustíveis da crise tucana.
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Embora Aécio tenha obtido em 2014 mais de 48 milhões de votos, denúncias de corrupção ligando seu nome aos escândalos da JBS/Friboi e o surgimento de nomes viáveis no espectro de direita como Jair Bolsonaro e João Amoêdo reduziram o eleitorado do PSDB, que votava na legenda por ser a opção mais à direita que existia em uma disputa contra o Partido dos Trabalhadores.
O calvário atravessado por Aécio Neves, candidato natural do PSDB em 2018 à Presidência, fez com que surgissem dois grupos em 2017: os chamados “cabeças brancas”, ligados a nomes antigos do tucanato como Geraldo Alckmin, Fernando Henrique Cardoso, José Serra e Aloysio Nunes Ferreira; e os “cabeça pretas”, ligados a parlamentares como Daniel Coelho, Pedro Cunha Lima, Mariana Carvalho e o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE), que acabou assumindo de maneira interina a legenda quando Aécio afastou-se da presidência do partido.
Os “cabeças brancas” conseguiram impor Geraldo Alckmin como Presidente do PSDB, gerando desfiliações no grupo dos “cabeça pretas” como Daniel Coelho que rumou ao PPS (atual Cidadania) e de Elena Landau, economista que participou da equipe econômica de Fernando Henrique Cardoso que passou a integrar o movimento de renovação política Livres. Este processo de fissura interna fez com que Alckmin, mesmo tendo o comando do partido, o maior tempo de televisão e a maior quantidade de alianças partidárias obtivesse o pior desempenho eleitoral da história do PSDB em uma eleição presidencial com 4,76% dos votos.
Como na política não existe vácuo, João Dória, recém-eleito governador de São Paulo forçando em sua campanha um “BolsoDória” em detrimento ao seu padrinho político Geraldo Alckmin, tomou conta do partido com a então oposição dos “cabeça brancas”, sendo o fiador da campanha do ex-deputado federal pernambucano Bruno Araújo rumo à presidência do partido.
Por outro lado, Aécio Neves conseguiu manter sua influência nos bastidores do tucanato, mesmo estando desgastado politicamente. Em 2018, foi praticamente obrigado a concorrer ao mandato de deputado federal para conservar algum mandato após seu derretimento como liderança nacional.
Dória escolheu Aécio como inimigo interno, buscando a todo custo expulsar o deputado federal e tirar a sua influência interna. Um exemplo foi no início da 56º Legislatura, quando Dória apoiava Beto Pereira (PSDB-MS) como líder da bancada, enquanto Neves apoiava Celso Sabino (PSDB-PA) para o posto. Ao fim, os deputados acharam um nome de consenso que agradava aos dois grupos: Carlos Sampaio (PSDB-SP). O governador paulista tomava cada vez mais conta do partido e dos diretórios estaduais, indicando aliados como no Rio de Janeiro, em que influenciou a nomeação de Paulo Marinho como presidente estadual.
Mas o processo de oposição cega e sistemática de Dória ao Governo Federal, combinado com as suas interferências na bancada do PSDB na Câmara acabaram fortalecendo o grupo do deputado mineiro. Enquanto Dória era um dos fiadores da eleição de Baleia Rossi (MDB-SP) à presidência da Câmara, Aécio levou seu grupo a apoiar o candidato apoiado pelo Palácio do Planalto, Arthur Lira (PP-AL).
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João Dória, embora governador do maior estado do país, assiste seu grupo se esvaziar no PSDB após a eleição na Câmara: Bruno Araújo, seu aliado de outrora não garantiu a legenda para 2022 para Dória, forçando o partido a ter eleições prévias e ainda trocou presidências de diretórios estaduais, trocando Paulo Marinho pelo deputado federal Otávio Leite (PSDB-RJ) na presidência do diretório do estado do Rio de Janeiro, além de Aécio Neves emplacar o novo líder da bancada na Câmara, Deputado Rodrigo de Castro (PSDB-MG).
Além disso, Fernando Henrique Cardoso, ex-presidente, vem adotando uma postura cada vez próxima do PT, o que desagrada o partido internamente e deslegitima qualquer candidatura tucana como algo diferente do petismo.
O PSDB entra em seu processo de eleições prévias ainda mais dividido: Dória terá que enfrentar o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite, apoiado pelo grupo de Aécio Neves; além do senador cearense Tasso Jereissati e do ex-prefeito de Manaus, Arthur Neto. Há ainda o fato de que foi definido que os votos dos mandatários eleitos pelo PSDB terão mais peso que o voto dos filiados comuns, o que beneficia Neves e Leite e impõe uma derrota para o PSDB paulista, que deseja emplacar o mandatário paulista como seu presidenciável.
Leite já saiu na frente em busca de apoiadores, começando sua campanha no Rio de Janeiro se reunindo com o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes (PSD), nome próximo de Lula e do PT no estado, mas que foi eleito com apoio do PSDB na eleição de 2020 e com Luciano Huck, apresentador de TV que financia o movimento de renovação política RenovaBR.
A divisão interna no PSDB, somada ao desejo de poder entre João Dória e Aécio Neves e a presença de candidatos liberais e conservadores com viabilidade eleitoral poderão levar a legenda para o mesmo caminho de 2018, onde candidatos tucanos para Governador, Senador, Deputado Federal e Estadual praticamente esqueceram que o partido tinha candidato à presidência e colaboraram com o desastre da campanha de Alckmin e Ana Amélia Lemos.
No Brasil atual, enquanto existir uma esquerda marxista organizada e com viabilidade eleitoral, uma tentativa de realizar uma política sociaL-democrata nos moldes europeus já nasce morta.
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