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Voto é esmola ou investimento?

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O voto pode ser esmola ou investimento e cabe ao eleitor e ao eleito escolherem. Quando é dado despretensiosamente, sem que se aguarde retorno, só para saciar uma vontade passageira da alma ou do juízo, ou evitar um constrangimento legal, o voto é uma esmola. O eleito o recebe e segue caminho para usá-lo como bem entender, por exemplo, dar vazão aos próprios vícios, embebedar-se, cheirar cola, comprar cigarros ou uma arma para assaltar ou matar alguém. O destino da esmola só cabe a quem a recebe. Quem deu, deu e pode considerar perdido aquilo que deu.

Quem exige retorno do voto que entregou a alguém, na verdade, faz um investimento e como sabe que há bons e péssimos administradores dos recursos de terceiros, o eleitor tenta escolher o melhor administrador para o voto que destina.

Para garantir um bom retorno, o investidor acompanha o destino do voto e fica de olho no administrador, naquele que foi eleito. O voto, para quem o tem como investimento, é aplicação de prazo certo e que deve apresentar rendimento crescente ao longo do tempo. E se o retorno não é o esperado, o resgate ocorrerá no vencimento e outro administrador será escolhido.

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Há, contudo, situações em que os investidores não encontram administradores dignos, então, que cuidem de seus investimentos e destinem a si mesmo o voto próprio e convençam aos demais formadores do grupo a lhes dar uma oportunidade para mostrar que fazem melhor. Sejam candidatos.

O problema dos eleitores que fazem do voto uma esmola ou preferem jogá-lo no lixo, é exigirem uma parte do retorno daqueles que investiram. É o caso dos que pedem bons hospitais, polícia nas ruas, acesso aos serviços da Justiça, segurança para os seus negócios e contratos, liberdade de opinião e imprensa, sem o trabalho de escolher quem gerenciará tudo isso para eles. Esse tipo de gente torna-se amarga e cínica. Berra e esbraveja, porque o investimento feito pelos outros não lhe dá o retorno que gostaria.

Para essa gente, a política é algo sujo, nojento, que não merece que os dignos percam tempo com ela. No entanto, “a vida pública não é somente política, mas também e primeiro, intelectual, moral, econômica, religiosa. Abarca todos os costumes coletivos, incluindo os modos de vestir e de ter prazer” (A Rebelião das Massas). O problema é que, pela política, pelo voto, se decide todo o resto. Quem garante a liberdade não é o bom senso do administrador de plantão, mas quem lhe dá a autoridade, legitimidade e legalidade, para agir. Esse alguém é o eleitor.

No “Diálogo com Amaral Peixoto”, entrevistas que Aspásia Camargo, Lucia Hippolito, Maria Celina Soares D’Araujo e Dora Rocha Flaksman – quatro personalidades fantásticas – fizeram com Amaral Peixoto, há uma passagem que, em favor do meu argumento, reproduzo. Está no conjunto da resposta a uma das perguntas que fez Aspásia. Disse Amaral:

“Uma vez, eu era embaixador em Washington e fiz uma palestra na Associação Comercial aqui do Rio. Quando terminei, o Rui de Almeida, que era o presidente, elogiou muito e perguntou se eu queria dizer mais alguma coisa. Eu disse: “Quero. Sou presidente de um partido. Faço um apelo aos senhores para que entrem para a política. Escolham um partido e entrem. Se os senhores não entrarem, às vezes é o rebotalho que entra. Na hora de formar a chapa, não temos como escolher e somos obrigados a aceitar os elementos que nos batem à porta. Vejam o mal que os senhores fazem ao país, não se interessando pela política”.

Amaral Peixoto informou que naquele momento, em 1958, ninguém aceitou o convite. Mas, após o golpe de 64, o presidente da Associação Comercial andou a buscar, entre os associados, quem se filiasse ao partido do governo. Amaral completou: “Infelizmente não me encontrei mais com o Rui, que faleceu logo depois do golpe, porque eu ia dizer: “Agora é tarde, vocês querem fazer política quando a política acabou”.

Amaral Peixoto não viveu para saber como andam as coisas por aqui hoje, tempo em que os líderes dos partidos dão a vida por um rebotalho. Mas, isso não é motivo suficiente para se deixar com eles a liberdade que eles têm. É possível confrontá-los ou criar outros espaços. Brizola para ter o dele, fez um partido. Lula, do mesmo modo, Fernando Henrique e os companheiros fizeram o mesmo para fugirem do domínio do Orestes Quércia. Marina criou o dela e Amoedo fez o mesmo. Dá trabalho? Dá. Mas, o que temos não nos dá muito mais?

O voto é um precioso instrumento de participação política e transformação para quem o entrega e para quem o recebe e, pelo milagre da democracia, pode sim, que o entrega ser o mesmo que o recebe. A isso se dá o nome de participação política. Ah! Se todos os que opinam e esculhambam valorizassem, de verdade, a participação política! A vida de todos seria melhor.

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Aviso

As opiniões contidas nos artigos nem sempre representam as posições editoriais do Boletim da Liberdade, tampouco de seus editores.

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