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A última grande crise energética deu o governo de bandeja para o PT. O que fazer para evitar o mesmo destino

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*Douglas Sandri

Em 2001, o Brasil viveu um impensável apagão nacional, algo que forçou o racionamento de água e energia elétrica. Foi uma medida drástica que desgastou sobremaneira o governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), então em seu segundo mandato na presidência da República. O apagão foi crucial para minar a sucessão tucana e a chegada do PT ao Planalto. Duas décadas depois, com o país em meio a uma estiagem histórica, as ameaças estão de volta — tanto de novo apagão, como da volta do PT e da esquerda ao poder, em sua versão mais estatista e sem escrúpulos possível.

Para entendermos o que está acontecendo no setor elétrico, mais importante do que olhar para foto do momento é vermos o filme completo. Um olhar em retrospectiva facilita a projeção do futuro. Durante o período militar, grandes obras foram viabilizadas, como a construção das termonucleares de Angra, no Rio de Janeiro, e da hidrelétrica de Itaipu, no Paraná — obras de grande vulto sob forte dirigismo estatal.

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Porém, o engessamento da Constituição de 1988, os apelos ambientais, a burocracia estatal para a liberação de licenças e falta de orçamento impediram grandes obras nos anos 1990, resultando na estagnação de um setor que, por essência, precisa de constantes modernizações. Em 2001, com o crescimento do consumo após a estabilização da moeda com o Plano Real, a conta veio. O Brasil tinha um sistema arcaico, sob forte influência de uma grande estatal federal (a Eletrobras) com subsidiárias. Somado a estatais distribuidoras nos estados, tínhamos um sistema baseado no planejamento central.

Foi preciso um apagão para que o governo, naquela época, tivesse um choque de realidade. Ao se deparar com a necessidade de reformas, felizmente, o governo escolheu o caminho certo com a criação do mercado livre de energia, que permite aos consumidores comprar energia elétrica diretamente dos fornecedores, além de vários avanços que reestruturaram o setor elétrico. Mas, como era fim de governo, a privatização da Eletrobras não foi possível há duas décadas.

O baque que o país tomou com o apagão forçou as forças políticas e econômicas a se ajustarem. Adequações de rota colocaram o sistema elétrico na direção certa nos primeiros anos dos anos 2000. As estatais estaduais passaram a ser privatizadas pelos governos locais. Mas a Eletrobras seguia sendo um problema. O que já era ruim foi agravado de vez quando Lula, presidente, num ato político, retirou a estatal que viria a ser foco de corrupção nos governos petistas do Plano Nacional de Desestatização (PND), em 2004.

Não bastasse a ineficiência, a Eletrobras foi o pivô do plano de Dilma Rousseff de reduzir em 20% o preço da energia elétrica. Via Medida Provisória, a ex-presidente petista destruiu o valor da companhia e comprometeu o setor ao impor péssimas condições para as renovações de contrato da estatal. A energia subiu mais de 50% logo após a reeleição de Dilma em 2014, quando o resultado apareceu. No entanto, o sistema continuava carente de reformas e ampliação do mercado livre de energia, criado em 2001 apenas para clientes de grande porte, geralmente a indústria.

A Eletrobras passou por um grande desinvestimento. A companhia também deixou de participar de leilões de ativos, reduzindo sua participação de 40% para 20% do mercado. A privatização da empresa seria necessária para que avancem outras reformas no setor. Ciente dessa necessidade, o então presidente Michel Temer enviou um Projeto de Lei que pedia a reinclusão da Eletrobras no PND, de onde foi retirada por Lula. O governo Bolsonaro enviou também um PL. Mas nenhum destes avançou. Então, neste ano, Bolsonaro editou uma MP, já recheada de generosidades para facilitar o endosso do Congresso. A ideia era vencer a resistência e o patrimonialismo de velhas oligarquias políticas de Brasília e, assim, viabilizar a capitalização e privatização da empresa. Esta história estamos vendo agora.

Em meio ao menor nível de chuvas já registrado, com risco iminente de novo apagão e racionamento de energia, os parlamentares pioraram ainda mais o texto na tramitação pelo Congresso e incluíram “jabutis” de toda ordem que desvirtuaram o espírito original do projeto como “pedágio” para aprovação da medida provisória.

Em suma, a solução segue sendo mais iniciativa privada e livre mercado, e menos Estado e dirigismo central no setor elétrico. Por um lado, a MP que sai do Congresso e vai à sanção presidencial possibilitou a redução do Estado no setor, quiçá com a privatização da Eletrobras. Mas aumentou o dirigismo estatal. O texto que foi aprovado determina a aquisição obrigatória de energia de usinas termelétricas que ainda não existem, a serem instaladas em locais que sequer são atendidos por gasodutos, sempre a preços tabelados artificialmente mais elevados do que o mercado, além de subsídios para térmicas a carvão. Parlamentares denunciam dispositivos que limitam ou eliminam a concorrência, beneficiando pontualmente alguns players do setor.

O texto aprovado na Câmara era ruim. O Senado conseguiu a façanha de piorar. Do jeito como está, não é privatização nem capitalização, pois institui benefícios setoriais e uma série de privilégios, com potencial para impor mais custos aos consumidores. Infelizmente, a privatização da Eletrobrás, da forma como desenhada, cria reservas de mercado e prolonga subsídios. Manda um sinal de que a expansão do setor elétrico não vai se dar pela concorrência, o que resultaria em preços menores. Na prática, os “jabutis” que o Congresso coloca bagunçam um setor que precisa ser aberto à livre iniciativa e ao livre mercado.

Nesse cenário, reformas “meia-boca” são ótimas para a esquerda jogar na conta dos liberais os resultados ineficientes. Algo como “tá vendo no que deu a privatização que você disse que ia resolver?”. É um argumento desonesto, típico da mentalidade estatista que causa o problema, tumultua o ambiente para que não seja solucionado e, quando algo é feito, faz de tudo para que o ideal não seja possível. Até que esse modus operandi seja desmascarado, a esquerda faz estrago na contaminação do debate por uma economia mais aberta e dinâmica, sem tanta interferência estatal.

Posicionar sua defesa por um estado forte e dono de empresa — mais um apagão para coroar —, é tudo que o PT espera para facilitar o caminho e emplacar Lula de volta no Planalto, reforçado se algum escândalo puder ser associado ao processo de privatização.

O governo corre contra o tempo — e contra a chuva — para impedir um apagão nacional, símbolo máximo da incompetência estatal.

*Douglas Sandri é graduado em engenharia elétrica, assessor parlamentar na Câmara dos Deputados e presidente do IFL Brasília.

Foto: Reprodução/Arquivo pessoal.

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Aviso

As opiniões contidas nos artigos nem sempre representam as posições editoriais do Boletim da Liberdade, tampouco de seus editores.

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