Na semana passada chegou a mim uma leitura certeira da Anitta sobre a comunicação política do presidente. Ela identificou a estratégia de marketing que está sendo colocada em prática, e passou mais entendimento sobre a construção do personagem que muito candidato experiente por aí.
Anitta respondeu a um twitter de um colega que criticava Bolsonaro por fazer piada de um comentário dela da seguinte forma:
A cantora destaca ainda no thread para o fato de o governo estar usando músicas dos artistas que mais criticam o Bolsonaro no fundo dos seus stories, como uma falsa sinalização de “bandeira branca”. E, também, o uso de um humor debochado para retrucar críticas. Ou seja, trocaram a tática da comunicação combativa e passaram adotar o humor e a leveza.
Mas esse movimento de banalizar críticas sérias de forma irresponsável não é nova. Bolsonaro e seu marketing fizeram isso contra João Amoedo, quando ele se tornou a maior liderança da direita a denunciar seu desgoverno. Zombaram do nome do João, criaram apelidos hostis e fizeram memes ironizando suas falas (sempre recortadas e reposicionadas fora de contexto). Para a rede bolsonarista, João virou aquele que “só reclama e não produz nada”, “de mal com a vida”. Conseguiram emplacar essa narrativa em um homem que fundou um partido, trabalha como voluntário pelo Brasil há 10 anos e que estava denunciando mortes e descaso em uma pandemia. Mesma estratégia usada contra os artistas.
Lembremos, ainda, que o marketing de Bolsonaro fez a ditadura brasileira ser vista por alguns como um momento de “restauração da ordem” mesmo quando toda as ciências humanas provou o contrário. Fizeram o silencio em relação à guerra da Ucrânia ser visto como um plano engenhoso do presidente em defesa dos interesses econômicos brasileiros. Fizeram a culpa da inflação ser atribuída aos “fanáticos” do “fiquem em casa”. Tudo isso com pitadas de humor e chacota.
A capacidade de Bolsonaro manipular a opinião pública para adotar narrativas absolutamente esdrúxulas é impressionante. Mas isso não é apenas talento, existe uma boa dose de mau-caratismo, pois instrumentos ilegais como criação de fake news e uso de robôs são usados recorrentemente pela sua militância organizada. Bolsonaro não é orgânico.
Para sair desse labirinto que nos encontramos, onde toda crítica é transformada em uma narrativa que reforça a imagem de um presidente injustiçado e atacado por privilegiados, Anitta defende:
“Eu trocaria o slogan “fora fulaninho” para “muda brasil” ou algo que desvincule completamente a narrativa do nome dele. Pois isso, no momento, só vai dar mais mídia e consequentemente mais força (para o fulano). Vocês não me verão falando “fora fulaninho” até as eleições acabarem. E sugiro a quem for contra ele fazer o mesmo.”
Anitta defende sua estratégia contando que ela mesma usou essa tática para seu crescimento na mídia, orientada por seus marqueteiros. Quando recebeu críticas sobre a qualidade de sua música, ou de desavenças públicas, respondia fazendo graça e com leveza. Ou seja, toda crítica que ela recebia, ela ganhava ainda mais engajamento, pois na discussão ela adotava a postura de “gente boa”, “desencanada” e, por isso, gerava mais identificação com seus seguidores que a outra parte que estava sempre atacando e gerando polémica.
Mas é preciso atentar que essa “leveza do humor” quando usada na política e em reação às críticas relacionadas ao menosprezo à vida e ao respeito ao próximo, não representa menos extremismo, pelo contrário, representa uma banalização da importância das conquistas sociais para o progresso. Essa “leveza” não deveria gerar identificação pois estamos no mundo real onde crianças ficaram sem estudo, pessoas morreram asfixiadas em Manaus e torturados pela ditadura ainda sofrem com o trauma de um estado autoritário.
Concordo com Anitta que não devemos mais dar munição ao fulano e, sim, devemos passar fortificar o caminho que queremos para o Brasil.
Ao invés de falar fora fulano, digamos sim à terceira via.
Ao invés de atacar militantes fulanistas de extremistas, defendamos os moderados.
Ao invés de destacar as características fascistas do governo, reforcemos os valores da democracia.
Com essa postura não estaremos esquecendo todo mal e incompetência que o atual governo nos presenteou; estaremos apenas minando uma estratégia de marketing que se alimenta da polêmica para ganhar corpo.
Foto: Foto: Anitta (Tânia Rêgo/Agência Brasil) e Jair Bolsonaro (Marcelo Camargo/Agência Brasil)