*Edson Agatti Lima
Imagine o cenário: uma invasão alienígena está vindo à Terra. A ameaça é real. Temos informação de que chegarão em 3 meses. São hostis e virão para matar a todos nós. O diálogo não é possível e a única esperança que temos para detê-los é construir armas, tanques, aviões, espaçonaves, e enfrentá-los numa guerra.
Ao mesmo tempo as pessoas entram em pânico e se escondem dentro de suas casas. A economia para e só sobram as atividades essenciais para nossa sobrevivência – supermercados e farmácias. Por causa disso, as pessoas que trabalhavam em áreas “não essenciais” perdem sua renda, diversas empresas quebram, e a economia como um todo começa a afundar.
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Você é o governante. É pessoa honesta, quer fazer o bem, e tem três opções para alocação de recursos:
1) Produzir armas para enfrentar os alienígenas;
2) Auxiliar as pessoas mais necessitadas, que foram afetados pela crise econômica;
3) Gastar com empresas estatais deficitárias, ineficientes, corruptas, sugadoras de recursos e que não ajudam em nada no enfrentamento à ameaça.
O que você faria?
Mantenha em mente que o fenômeno da escassez é inevitável. Se você aloca recursos nas estatais, por exemplo, necessariamente terá menos recursos para construir armas para enfrentar os alienígenas.
Também não adianta imprimir dinheiro. Por mais que existam nuances teóricas quanto à natureza inflacionária de determinada quantidade de dinheiro novo na economia, invariavelmente, a partir de algum ponto, o dinheiro novo não produzirá unidades adicionais dos recursos que você precisa.
Qualquer pessoa sensata colocaria a maior parte dos recursos no item 1, sob pena de arriscar a sobrevivência da raça humana. Se em algum momento constatar-se que as pessoas estão sem comida e passam fome a ponto de não conseguirem lutar contra os alienígenas, faria sentido investir o excedente no item 2.
Agora, você teria que ser muito maluco para gastar com o item 3 nesta situação.
Voltamos para o momento em que vivemos. Não é tão extremo quanto a invasão alienígena, mas é o mais grave que nossa geração já viveu: a pandemia da COVID-19.
O inimigo é o vírus e, assim como numa guerra, tem matado muita gente, ameaça matar muito mais e o mercado não consegue realocar recursos de forma rápida e eficiente para enfrentar o inimigo. Ou seja, as pessoas provavelmente não conseguirão se coordenar de forma voluntária para enfrentar o vírus, tão rápido quanto uma imposição estatal conseguiria.
Por princípio, a intervenção estatal mais adequada é aquela que, com determinado volume de recurso, traz o maior benefício para a população. Portanto, quanto mais intensa a ameaça, mais teremos de alocar recursos para enfrentar diretamente tal ameaça. No caso da atual crise, isto é desejável para que possamos salvar o máximo de vidas possível e retornar à normalidade de nossas vidas com mais velocidade e segurança.
Mas a pergunta que não se cala é: quais são, de fato, as intervenções estatais necessárias para enfrentar o corona vírus?
Para ajudar a entender a questão, podemos categorizar tais intervenções de forma parecida como no exemplo da invasão alienígena:
1. Produzir armas para enfrentar o inimigo: gastos com subsídios ao sistema de saúde que incluem o aumento da capacidade instalada dos hospitais, mão de obra de médicos e enfermeiros, remédios, respiradores, máscaras, testes em massa, etc.
2. Ajudar os necessitados: gastos para ajudar quem mais sofre com os efeitos colaterais da crise econômica gerada pela pandemia. Por exemplo, um auxílio financeiro emergencial.
3. O resto: gastos com outras coisas, que podem até ter alguma outra utilidade social, mas que não ajudam em nada ao enfrentamento da pandemia, e dentre os quais estão os custos de manter as empresas estatais deficitárias já existentes.
Portanto a ajuda aos necessitados, apesar de também importante, se tornaria segunda prioridade.
Quanto mais intensa a ameaça, mais importante se torna enfrentá-la de frente. Ao aceitarmos que a pandemia é uma grave ameaça e que devemos enfrentá-la, assim como seria na invasão alienígena, há maior necessidade de alocar recursos para “produção de armas” para o sistema de saúde, em detrimento aos outros gastos. Portanto a ajuda aos necessitados, apesar de também importante, se tornaria segunda prioridade.
Não consigo imaginar qualquer argumento razoável para se desejar investimento no item 3 num momento como este. Já que o recurso empregado aqui, necessariamente também retira recursos das outras atividades produtivas na sociedade e não traz utilidade alguma para o enfrentamento da crise.
Isto serve para mostrar que as intervenções estatais não podem ser “jogadas todas no mesmo bolo” quando discutimos o papel do Estado na sociedade. Além de intervir em caso de guerras e pandemias, também é papel do Estado proteger a nossa vida, resguardar o império da lei, o direito de propriedade, a segurança pública e a nossa liberdade. Poucas são as outras atribuições justificáveis.
Recentemente Lula causou alvoroço ao fazer este infeliz comentário:
“Quando eu vejo essas pessoas acharem que tem que vender tudo que é público e que tudo que é público não presta nada… Ainda bem que a natureza… criou esse monstro chamado corona vírus, porque… apenas o estado é capaz de dar solução a determinadas crises.”
Ele continua:
“Imagina quando Roosevelt teve que agir na guerra. Você acha que ele estava preocupado com orçamento? Não! Ele tinha que fazer armas para vencer a guerra.”
O alvo da crítica é o governo Bolsonaro, com claro foco nos discursos de privatização e outras políticas econômicas liberais de Paulo Guedes. Não vou aqui rechaçar o comentário do Lula nem defender o governo Bolsonaro, o que eu quero é debater as ideias por trás do comentário – as quais devem receber respaldo da classe intelectual.
Senhor Lula, lhe respondo: sim, este monstro chamado corona vírus demonstrou que o Estado pode ajudar enfrentar as pandemias, assim como nas guerras. Sim, assim como Roosevelt fez na guerra, temos que realocar os recursos disponíveis para produzir “armas” contra o vírus.
E… é exatamente por causa disso que, mais do que nunca, temos que vender todo o resto que é público e que serve, preponderantemente, para atender ao fisiologismo político com loteamento de cargos e sugar os recursos de quem produz. Logo, quanto mais rápido esse aparato deixar de existir, mais recursos estarão disponíveis para enfrentar tais guerras e/ou menor será a necessidade de arrecadação de impostos.
Ah, e de fato, para nós, os demais cidadãos, todo esse resto aí “não presta nada [sic]”!!!
*Edson Agatti Lima é Mestre em Economia pela George Mason University, associado do IFL Brasília, e fundador do Hayek Global College.
Foto: Reprodução/Arquivo Pessoal
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