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‘Defendo que o liberalismo é uma doutrina que vai ao encontro da transgeneridade’, diz ativista

Boletim da Liberdade entrevista a ativista liberal e trans Mariana Valentim, também conselheira fiscal do Livres, autora de um artigo em defesa da liberdade de gênero como pauta liberal
Foto: Divulgação

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A arquiteta e ativista liberal Mariana Valentim, radicada em Brasília, ganhou as manchetes do Boletim da Liberdade no final de janeiro com a repercussão de um artigo publicado no Livres sobre transgeneridade. Associada à entidade e transexual, Valentim sustentou no texto que a liberdade de gênero deveria ser vista como “o primeiro passo para todas as outras” liberdades e, portanto, objeto de defesa dos liberais.

O texto repercutiu no meio liberal, estimulando o debate sobre identidade de gênero – pauta essa que a própria ativista reconhece ser “explorada quase em sua totalidade por coletivos e partidos de esquerda”. No início de fevereiro, Mariana – que também é ligada ao LOLA Brasil – alçou outro posto dentro do movimento liberal: foi eleita em Assembleia como uma das conselheiras fiscais do Livres.

Nesta entrevista ao Boletim da Liberdade, dentre outros assuntos, são abordados temas como o fato de muitos grupos ainda não compreenderem a liberdade de gênero, como ela se descobriu liberal e trans, além sobre como a esquerda lida com a pauta.

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Boletim da Liberdade: Como você avalia a repercussão do artigo que você escreveu para o Livres sustentando que a ‘liberdade de gênero é o primeiro passo para todas as outras’?

Mariana Valentim: O artigo rendeu um belo debate, inclusive porque no mesmo dia foi ao ar uma entrevista minha e da Dionne Freitas [n.e: ativista intersexo associada ao Livres] sobre o dia da visibilidade trans. A repercussão foi extremamente positiva e acabou gerando uma discussão sobre a questão da transgeneridade no meio liberal, o que é algo raro, pois a pauta trans é explorada quase em sua totalidade por coletivos e partidos de esquerda. A ideia da liberdade de gênero é nova para a maioria dos liberais e por isso a polêmica foi grande.

Boletim da Liberdade: Muitos conservadores e até mesmo liberais não concordam (ou não entendem) o conceito de gênero, muitas vezes associando-o ao sexo biológico ou a uma invenção da esquerda. Como você vê reações como essas?

Mariana Valentim: A separação entre identidade gênero, sexualidade e sexo biológico são conceitos que o publico em geral está entrando em contato nos últimos anos, então uma confusão é perfeitamente entendível. Já existe muita literatura e estudos que dão embasamento a essa questão que deveriam ser ponto pacifico. O que vem acontecendo é que tal como o terraplanismo surgiu através de uma narrativa fantasiosa, foi criado um espantalho da “ideologia” de gênero inventado para confundir pessoas, gerar medo e desviar a foco de algo que vem acontecendo nas ultimas décadas: o mundo está cada dia mais diverso e plural. E isso significa liberdade de ser, uma conquista dos tempos modernos que incomodam quem deseja controle e domínio sobre pessoas.

Foi criado um espantalho da “ideologia” de gênero inventado para confundir pessoas, gerar medo e desviar a foco de algo que vem acontecendo nas ultimas décadas: o mundo está cada dia mais diverso e plural

Boletim da Liberdade: É possível ser liberal e não reconhecer ou não se importar com a liberdade de gênero? 

Mariana Valentim: A liberdade de gênero é a primeira das liberdades que o individuo entra em contato. Se você foge do padrão imposto pela sociedade para meninos e meninas, seja na sua forma de se vestir, se portar ou se expressar, há uma tendência de que você seja reprimido pela família e pela sociedade. Mas se você é liberal e defende a propriedade, não há nada mais coerente do que defender a autopropriedade, ou seja, o direito do individuo sobre a sua individualidade e o seu corpo.

Mariana Valentim em evento do Livres (a terceira, da esquerda para a direita) (Foto: Divulgação)

Boletim da Liberdade: O movimento liberal já lida suficientemente bem com o assunto ou você ainda enxerga haver preconceitos, tanto ao tema quanto aos ativistas transgêneros?

Mariana Valentim: Essa questão é muito pouco abordada dentro do liberalismo. Grande parte dos liberais alia a questão de gênero a uma pauta da esquerda. E os próprios transgêneros não têm dentro do movimento uma acolhida ideal como acontece em coletivos da esquerda. Eu sou um ponto fora da curva e já tive muitos problemas com liberais “conservadores” que ainda não compreendem que a liberdade do individuo passa pela questão de gênero. Mas encontrei no Livres, no SFL [Students for Liberty] e no LOLA  pessoas dispostas a encarar esse desafio junto comigo. É uma luta diária e bem lenta, por sinal, mas sou uma otimista incorrigível.

Já tive muitos problemas com liberais “conservadores” que ainda não compreendem que a liberdade do individuo passa pela questão de gênero. Mas encontrei no Livres, no SFL [Students for Liberty] e no LOLA  pessoas dispostas a encarar esse desafio junto comigo

Boletim da Liberdade: Como você se descobriu liberal e transgênero? Foi ao mesmo tempo?

Mariana Valentim: No meu caso, eu descobri primeiro que era transgênero. É algo que na maioria esmagadora dos casos acontece na infância. Mas, na época, eu não sabia dar “nome aos bois”. Meu primeiro contato com uma mulher trans foi com a Roberta Close, famosa trans dos anos 80. Em relação a me descobrir liberal, comecei a flertar com a doutrina no final dos anos 1990, lendo Roberto Campos e Paulo Francis, mas foi no inicio dessa década que entrei em contato de forma mais intensa e profunda com a doutrina liberal. Me apaixonei pelo liberalismo, mas tive que me afastar por um tempo, devido ao movimento estar no inicio e ver que muitos ditos liberais pareciam mais crianças que gritavam que queriam liberdade própria mas não a alheia e, por isso, não entendiam a beleza por trás de toda a filosofia liberal.

Boletim da Liberdade: Como você enxerga que a esquerda lida com a questão de minorias LGBTs: há interesse real em entender e acolher, ou há – como acusam alguns grupos – apenas interesse em conquistar minorias organizadas para seu campo político?

Mariana Valentim: Eu, como diria a esquerda, tenho “lugar de fala” para comentar, pois participei de movimentos esquerdistas por muitos anos. É obvio que existem pessoas sérias e instituições comprometidas, mas a grande maioria dos movimentos tem o interesse de coletivizar as pautas individuais, que – diga-se de passagem – é uma pauta originalmente liberal sequestrada pela esquerda, para interesses próprios que vão desde a eleição de políticos, conquista de cargos no governo a verbas estatais para ONG’s e afins. É só você ousar a desrespeitar sua cartilha que você é, literalmente, “cancelada”. O respeito ao individuo não existe. Por isso, defendo que o liberalismo é uma doutrina que vai ao encontro da transgeneridade, pois defende a liberdade do individuo e, em consequência disso, a liberdade de gênero.

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