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Saiba as principais mudanças do Marco Legal do Saneamento

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*André Bolini

Após votação na Câmara dos Deputados ainda em dezembro de 2019, quase seis meses depois, o Senado Federal aprovou o novo Marco Legal do Saneamento Básico, que segue para sanção presidencial. Já era hora, enfim, de um novo arcabouço regulatório para incentivar o investimento em água e esgoto, dada a atual situação brasileira. Afinal, em pleno 2020, mais de 100 milhões de brasileiros não têm coleta de esgoto em suas casas e 35 milhões sequer água potável encanada têm. O genocídio sanitário no País é silencioso: a cada ano, morrem mais de 15 mil brasileiros com doenças associadas à falta de saneamento.

A tragédia brasileira tem causas bastante claras: o modelo de incentivos no Brasil simplesmente não favorece o investimento em infraestrutura sanitária. Até então, os municípios poderiam contratar uma empresa estatal de água e esgoto sem qualquer concorrência na licitação – sendo que, via de regra, estatais de água representam um prato cheio para o uso político como moeda de troca e cabide de emprego. Não é coincidência que apenas 6% do saneamento básico brasileiro sejam manuseados por empresas privadas e 94% ficam com estatais (enquanto, no Chile, para efeitos de comparação, a rede privada atende 94% do país e 99% da população têm cobertura sanitária). E como incentivar o investimento? Vamos às principais mudanças:

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1) Concorrência com empresas privadas nas licitações
Com o novo Marco Legal do Saneamento, a concorrência torna-se obrigatória. Se, hoje em dia, um município poderia contratar a empresa estadual de saneamento sem abrir licitação para ter competição com outras empresas do setor nos chamados “contratos de programa”, agora, torna-se obrigatória a abertura de licitação para empresas públicas e privadas interessadas no contrato ofertado. Não se trata, portanto, da “privatização da água”, como alguns grupos políticos dizem, dado que não há preferência entre empresas privadas ou estatais. O que muda, de fato, é a possibilidade de empresas privadas serem contratadas caso ofereçam tarifas mais baratas e melhor serviço prestado em relação à estatal. Com a disputa obrigatória entre empresas por menor custo e maior benefício, quem é beneficiado é o cidadão que hoje não é bem atendido.

2) Inclusão de metas para universalizar a cobertura
A partir do projeto aprovado, os contratos públicos deverão incluir metas de universalização dos serviços de água e esgoto até 2033. Ou seja, para aprovar a contratação de uma empresa, será necessário comprovação de viabilidade econômico-financeira para atender a população, sendo que, até 2033, os investimentos em água encanada potável devem ter cobertura de 99% do País e cobertura de 90% de coleta de esgoto. Vale lembrar que a falta de condicionamento dos contratos a metas de cobertura provocou situações esdrúxulas, como a canibalização absoluta da rede de infraestrutura pela folha de pagamentos das empresas estatais, conforme se viu entre 2014 e 2017 com o aumento médio de 30% das tarifas e a simultânea queda de 3% dos investimentos.

3) Mais segurança jurídica a nível nacional
A nova regulação sanitária estabelece também que a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) passe a ter a competência para editar as normas de todo o País como referência e denominador comum para os serviços de saneamento. Com isso, há mais clareza nas regras e no ordenamento jurídico para trazer maior segurança jurídica para investidores privados. Note-se aqui a importância fundamental dos investimentos privados na medida em que se calcula montante necessário entre R$500 a R$700 bilhões investidos em infraestrutura nos próximos anos para universalizar a água e o esgoto até 2033. E, considerando o panorama fiscal brasileiro, com pouco espaço no orçamento público de entes municipais, estaduais e federais para investimentos e gastos discricionários, somente o capital privado poderá mobilizar tais valores.

4) Blocos de associação para municípios
Na regulação atual, o modelo conta com subsídios cruzados em que as cidades grandes atendidas por uma mesma empresa acabam financiando o saneamento em municípios menores. O novo Marco Legal do Saneamento acaba com o subsídio cruzado em virtude das distorções que são geradas, mas estabelece uma alternativa para garantir o atendimento dos municípios menores através dos blocos de municípios (não necessariamente vizinhos). Assim,os municípios de um mesmo bloco podem contratar serviços de forma coletiva e garantir a viabilidade econômico-financeira do investimento de saneamento em suas redes. Note-se, ainda, que, para garantir que nenhuma família de menor renda fique sem atendimento pela cobrança da tarifa, o projeto garante auxílios como descontos na conta e gratuidade na conexão do particular à rede coletora.

5) Fim dos lixões no Brasil até 2024
Por fim, o novo Marco Legal do Saneamento estende os prazos anteriormente definidos pela Política Nacional de Resíduos Sólidos para o encerramento de lixões a céu aberto, dadas as novas condições regulatórias. Com isso, o prazo para capitais e regiões metropolitanas de encerrar seus lixões vai até 2021 (anteriormente definido como 2018) e, para cidades com menos de 50 mil habitantes, até 2024. Os lixões, vale lembrar, ainda são uma realidade por todo o País e são fontes não apenas de contaminação do solo e lençóis freáticos, como principalmente focos de transmissão e proliferação de doenças como leptospirose.

Considerações gerais:

As condições medievais do saneamento básico brasileiro tornaram-se, enfim, foco do debate público. O Brasil precisa de reformas e reestruturações de suas instituições em todas as áreas e em todos os aspectos. Mas, sem fundações sólidas, uma casa próspera jamais será erguida. Investimento em saneamento é básico e essencial para a saúde – a cada R$1 investido em saneamento, a saúde economiza R$4 – e para o meio ambiente, além de necessário por seus impactos na geração de emprego e renda em meio a uma crise tão severa como a da pandemia da Covid-19. Enfim, um grande avanço para o Brasil com o novo Marco Legal do Saneamento!

*André Bolini é administrador pela FGV/SP e graduando em direito pela USP.

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Aviso

As opiniões contidas nos artigos nem sempre representam as posições editoriais do Boletim da Liberdade, tampouco de seus editores.

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