Mais uma década perdida: um sintoma de nossas instituições - Coluna André Bolini

Mais uma década perdida: um sintoma de nossas instituições

03.03.2021 07:07

Não foi uma exclusividade brasileira registrar retração econômica em 2020: o mundo todo, afinal, sofreu com as consequências da pandemia do COVID-19. Mas nenhum país conseguiu superar o desempenho acumulado brasileiro. Com o resultado do PIB de 2020, o Brasil consagra mais uma década como nula em seu crescimento econômico: de 2011 a 2020, o País cresceu em média 0,3% ao ano, de acordo com cálculos da Fundação Getulio Vargas. Em perspectiva temporal, tivemos a pior década da história, superando inclusive a década perdida de 1980, cuja média era de 1,6% por ano. E, como a população continuou crescendo em ritmo superior ao da economia, na prática, o PIB per capita foi ainda pior e retrocedeu aos níveis de 2009. E perder décadas de crescimento econômico não é obra do acaso: é trabalho profissional de anos.

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É certo que a pandemia castigou a economia com severidade, mas não podemos atribuir o fiasco da década ao coronavírus. Desde a bomba fiscal criada por Dilma Rousseff até a greve dos caminhoneiros, passando pela incapacidade de aprovar reformas e pela pandemia, a década perdida de 2011-20 é fruto de nossas instituições. Quando as regras do jogo são claras, abertas e contemplam de modo mais horizontal cada cidadão, via de regra, cria-se um ciclo de prosperidade com formação de mercados sólidos e abertos, trocas cada vez mais intensas e especializadas e, por consequência, mais produtividade e mais crescimento econômico para todos. Por outro lado, quando as instituições são mais fechadas, com menos participação da sociedade e maior protagonismo de grupos de interesse específicos, corporações e menor accountability dos gestores, via de regra, cria-se um ciclo vicioso de extrativismo e desigualdade gerada pelo próprio poder público. Com essa descrição, estimado leitor, fica fácil identificar qual é a realidade brasileira, não?

Ao invés de focar nos setores essenciais com efetividade e maior eficiência, o Estado brasileiro tende ao gigantismo e à interferência em todos os setores da vida nacional. Nas palavras de Margaret Thatcher, “precisa-se de um Estado pequeno e forte, e o que me parece é o que vocês têm no Brasil é exatamente o inverso, ou seja, um Estado grande e fraco”. E isso abre brechas que explicam nosso subdesenvolvimento: é nesse gigantismo que corporações se agarram a benefícios e tratamentos “diferenciados” que são pagos pelo resto da sociedade. É assim que a produtividade geral do País, pouco a pouco, vai se esfarelando. Uma década perdida não se faz com azar, mas sim com péssimas instituições.

A crise da Nova Matriz Econômica de Dilma Rousseff, por exemplo, mostrou como empresas estatais são facilmente capturadas pelo Poder Político e servem a propósitos eleitoreiros, como a Petrobrás e a Eletrobrás foram. Já a falta de autonomia do Banco Central, à época, permitiu o mesmo fenômeno com a taxa básica de juros: canetadas fiscalmente irresponsáveis, mas com ótimos dividendos políticos. Já a greve dos caminhoneiros remonta a uma história de alguns anos antes: as linhas de crédito subsidiadas (leia-se: “pagas pelo resto da sociedade”) para comprar caminhões e que, em 2018, iriam culminar num aumento artificial do número de caminhoneiros para o tanto de demanda por carga, o que derrubou o frete pela lei de oferta e demanda. E, a cada dia que as reformas econômicas atrasam, mais um dia de corporativismo, privilégios e ineficiência triunfam no Brasil. O resultado da pandemia foi juntar todos esses fatores e estressar os cenários.

Não existe receita simples, rápida ou mágica. Os voos de galinha continuarão ser constantes na história do Brasil enquanto nossas instituições favorecerem os favores políticos em detrimento da concorrência; enquanto favorecerem a proteção de corporações do Estado em detrimento do cidadão pagador de impostos; enquanto favorecerem desembargadores com “auxílio iPhone” em detrimento do aluno da rede pública de educação sem acesso à Internet para assistir aulas. Essa será só mais uma década perdida – dentre as tantas que ainda podem vir – se não remodelarmos nossas instituições.

Foto: Alan Santos/PR

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