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O que Schopenhauer diria sobre as músicas da era TikTok?

Maria Clara traz opinião sobre as músicas dos tempos atuais com base nos escritos de Schopenhauer

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Quando fiz a disciplina Filosofia da Música, apresentei um seminário sobre Arthur Schopenhauer que me marcou.
Sabe quando você sempre pensou algo, mas não sabia explicar, e encontra alguém que traduz isso perfeitamente? Pois é.

Schopenhauer escreveu:

“A essência do homem reside em sua vontade de se esforçar, ser satisfeita e de novo se esforçar, incessantemente. Sim, sua felicidade e bem-estar consistem apenas nisso: em que a transição do desejo para a satisfação, e desta para um novo desejo, ocorra rapidamente, pois a sua ausência de satisfação é o sofrimento, e a ausência de novo desejo é o anseio vazio, tédio. Justamente por isso, correspondendo ao que foi mencionado, a essência da melodia é um afastar-se, um desviar-se contínuo do tom fundamental por diversas vias, não apenas para os intervalos harmônicos, mas para cada tom, e para os intervalos extremos; contudo, sempre ocorre um retorno ao tom fundamental.
A melodia expressa por todos esses caminhos o esforço multifacetado da Vontade, mas também a satisfação mediante o reencontro final de um intervalo harmônico, e mais ainda do tom fundamental”.

Aqui ele explica como a melodia expressa justamente a essência de nossa vida, segundo ele.
Se nossa existência é um eterno desejar, realizar, e voltar a desejar, a melodia faz um movimento que nos remete a isso.

“Assim como a transição rápida do desejo para a satisfação, e desta para um novo desejo constitui a felicidade e o bem-estar, também as melodias rápidas, sem grandes desvios, são alegres. Já as melodias lentas, entremeadas por dissonâncias dolorosas, retornando ao tom fundamental apenas muitos compassos além, são tristes e análogas a satisfação demorada, difícil”.

“A música de dança, consistindo em frases curtas e fáceis, em movimento veloz, parece exprimir a felicidade comum fácil de ser alcançada. Ao contrário, o Allegro maestoso, com grandes frases, longos períodos, desvios amplos do tom fundamental, descreve um esforço mais elevado, mais nobre, em vista de um fim distante e sua realização final. O adágio fala do sofrimento associado a um grande e nobre esforço, a desdenhar qualquer felicidade vulgar”.

Aqui ele explicou porque uma música é triste, outra feliz… pois está demonstrando que sentimentos tem uma cadência que a música revela; que melodias lentas são mais melancólicas, já que quando estamos tristes geralmente ficamos quietos, mais vagarosos, mais demorados, menos elétricos. Já quando estamos felizes nos agitamos, quando a música é rápida remete a uma felicidade fácil de alcançar.

Nesse ensaio de Schopenhauer, ele termina dizendo:

“Infelizmente, falta música sacra, que é a melhor para o fundamento da intelecção na essência da música e para o fundamento da formação musical. Também o próprio fazer musical contribui bastante para a compreensão da música. Que a audição e a execução musicais sejam sempre recomendadas a todos como participação nessa arte balsâmica. Quem se entrega à ciência tem-de enobrecer por inteiro seu espírito, isso flui para tudo. Um filho das musas, do qual deve provir o sal da terra, tem-de, em seu prazer, pertencer às musas e procurar apenas divertimentos espirituais nobres. Jogar, beber e coisas semelhantes são atividades que devem ser deixadas aos filisteus. Que se gaste tempo e dinheiro indo a óperas e concertos […]

Após essa longa consideração sobre a essência da música, recomendo a todos a fruição dessa arte, antes de qualquer outra. Nenhuma outra arte faz efeito tão imediato e profundo sobre o homem, já que nenhuma outra nos permite conhecer tão profunda e imediatamente a essência verdadeira do mundo. A audição de uma música bela, plena de vozes, é por assim dizer um banho do espírito, que remove todas as impurezas, tudo que é diminuto”.

O apelo desse filósofo para que todos ouçam boas músicas faz-se cada vez mais urgente. Vivemos num tempo no Brasil em que as músicas mais famosas são feitas apenas para que os ouvintes mexam o corpo, e não a mente. Perdeu-se a noção do quanto é importante ouvir algo que edifique, transforme, eleve o espírito.

As músicas que os universitários ouvem são em sua maioria pornográficas, depressivas, objetificam e prostituem as mulheres, faz a mentalidade dos homens se reduzir ao sexo… Não há bons princípios nas letras. Quando são alegres reduzem a felicidade equivocadamente à festas, álcool, sexo e drogas.

Falta música que faz pensar, que enfeita a vida com beleza, que cura o coração, que desperta sentimentos que transformam, que eleva o espírito ao que é bom, belo e justo.

O filósofo ressaltou a importância da música sacra, esse gênero musical caracterizado por composições eruditas criadas para a cultura religiosa ou sob a influência da religião, que no entendimento mais restrito, está associada principalmente às tradições cristã e judaica.

Um dia ainda vou me interar mais sobre o curso de música na Universidade, mas penso que mesmo fora do departamento, deveria-se ouvir pelos corredores a boa música, a melodia elaborada, porque o conceito de música e capacidade de fazer juízo de qualidade deve ser mais elevado dentro desses ambientes que promovem o saber. Mas não é isso o que se vê.

Os jovens universitários deveriam revolucionar a industria musical do país, que fica cada vez mais indigesta. Mas eles são os maiores consumidores justamente dessas. Quando se faz esse tipo de críticas, as primeiras acusações são a de que o crítico é elitista e preconceituoso. Eles também dizem que não se pode afirmar que uma música é boa e a outra é ruim, porque é questão de gosto.

Os relativistas se recusam a fazer juízo de qualidade, mas há critérios objetivos para dizer se uma música é boa ou ruim, ainda que você goste ou não dela. A música ruim não é a música popular em relação às músicas clássicas. Acho que se pode achar boa música em todos os gêneros.

O que está em questão é que há uma decadência notável, por exemplo na diminuição do número de acordes da música brasileira, das letras resumidas à sensualidade, que fazem culto ao crime, ao tráfico, às drogas, ao álcool, e à promiscuidade.

Isso faz com que as almas dos ouvintes estejam mergulhadas numa degradação que reduz sua humanidade a tudo que é ruim, feio e prejudicial. Afasta o ser humano do que é divino, moral, bom e belo.

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