fbpx

O poder ainda emana do povo?

Poder emana do povo

Compartilhe

Por Allan Freire

“Todo o poder emana do povo” é um princípio fundamental dos sistemas democráticos, significando que a autoridade política reside no povo e é exercida por meio de seus representantes eleitos ou diretamente, conforme previsto na Constituição. Esse princípio, em tese, garante a soberania popular e a legitimidade do governo. No Brasil, ele está positivado no parágrafo único do artigo 1º da Constituição da República.

Além disso, o Brasil adota o princípio da separação dos poderes, fundamental em regimes democráticos, o qual prevê a divisão das funções do Estado em três poderes independentes e harmônicos: o Legislativo (que elabora as leis), o Executivo (que as executa) e o Judiciário (que julga os conflitos e garante a aplicação das leis). Assim, cada um dos poderes possui suas prerrogativas e deve, ou ao menos deveria, respeitar a independência e a competência dos demais.

Há muito se discute o ativismo judicial e todas as suas consequências. Ver o Supremo Tribunal Federal (STF) usurpando funções dos Poderes Executivo e Legislativo tornou-se uma cena quase cotidiana. Contudo, o que antes era observado em nível macro tem se manifestado também no micro. Isso porque até decisões políticas tomadas em assembleias legislativas estaduais e municipais estão sendo submetidas ao crivo do Judiciário, o que impede que o debate sobre matérias políticas ocorra em seu foro adequado: o Parlamento.

O que motivou inicialmente este artigo foi um fato ocorrido na Comissão de Educação e Cultura (CEC) da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF). No dia 07/05/2025, durante um debate sobre uma proposição legislativa que tratava da implementação de programas voltados à abordagem da chamada “ideologia de gênero” nas escolas públicas do Distrito Federal, o deputado Thiago Manzoni (PL-DF) posicionou-se contra a proposta. [1]

Durante a discussão da matéria, o deputado de direita apresentou argumentos políticos que fundamentaram sua oposição à proposta, por se tratar de uma pauta associada à cultura woke [2], a qual, segundo ele, tem desconstruído princípios fundamentais da família e causado diversos prejuízos à sociedade. Como contraponto, o deputado Gabriel Magno (PT-DF) leu uma decisão do STF, de relatoria do ministro Edson Fachin [3], que OBRIGA as escolas públicas de todo o Brasil a observarem fatores relacionados à chamada “ideologia de gênero”.

Logo após o deputado petista concluir a leitura da decisão “suprema”, o deputado Thiago Manzoni fez a seguinte indagação: “Se um tribunal já decidiu politicamente a matéria, de que serve o Parlamento? Se a decisão de um ministro, que não é representante do povo, define uma questão político-ideológica, então pode-se fechar o Parlamento e permitir que a Corte Suprema assuma, de uma vez por todas, o poder absoluto do Estado.” Sem apresentar argumentos em resposta, o deputado petista, que presidia a sessão, limitou-se a colocar a proposição em votação, a qual foi aprovada, com o voto contrário do deputado de direita.

Observar aquela cena me levou a refletir: será que o poder ainda emana do povo? O que vale mais nos dias de hoje — um milhão de pessoas protestando nas ruas, a maioria do Parlamento ou a decisão de um único ministro não eleito por meio de uma “canetada”? A resposta parece óbvia: o Brasil, atualmente, está nas mãos de 11 pessoas que detêm o poder da caneta. E o mais preocupante é que a Suprema Corte, que deveria proteger a lei e zelar pela separação dos Poderes, tem sido a primeira a ignorar e desrespeitar a Constituição Federal.

O Brasil já enfrentou diversas crises políticas; contudo, o que se vive hoje é, na verdade, uma crise institucional. A separação dos Poderes, idealizada por Montesquieu, deixou de existir na prática. O Supremo Tribunal Federal, que deveria apenas julgar, passou a legislar, executar e interpretar conforme seus próprios critérios, ignorando os representantes eleitos — ou seja, o povo, de quem deveria emanar o poder. Quando a decisão parte da Corte Suprema, a quem recorrer? Para muitos, hoje, o único recurso cabível é a oração, pois, embora alguns se considerem deuses, como diria o eterno Capitão Nascimento: ‘nunca serão’.

Retornando ao fato que motivou este artigo: será que o jovem deputado de esquerda não percebe o grave problema em que ele próprio se coloca ao abandonar o debate político para recorrer à leitura de uma determinação judicial sobre um tema essencialmente político, no âmbito da assembleia? Será que não enxerga que, seguindo por esse caminho, em breve poderá não haver mais necessidade do Parlamento? Basta observar os exemplos de países que adotaram essa linha: hoje, neles, já não existe mais o poder do povo.

A questão aqui não é o conteúdo da matéria em si (ideologia de gênero), mas a forma como está sendo implementada. Tenho certeza de que o deputado de direita, que demonstrou prezar pela democracia, não se oporia a ser vencido no voto, uma vez que, em tese, vivemos em um regime democrático. O problema é que, atualmente, todas as matérias políticas de maior repercussão no Brasil acabam sendo judicializadas — ou seja, transferem-se ao Judiciário questões que deveriam ser resolvidas pelo Legislativo, permitindo que o judiciário usurpe suas atribuições dos demais Poderes e decida conforme sua própria vontade.

No dia 09/05/2025, o STF derrubou a parte essencial da Suspensão de Andamento de Ação Penal (SAP) 01/2025, aprovada na Câmara dos Deputados em 07/05/2025, a qual suspendia a ação penal contra o deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ), réu na suposta tentativa de golpe de estilingue — ops, de Estado [4]. Trata-se de uma matéria aprovada no Plenário da Câmara, ou seja, uma decisão da maioria da população brasileira. Ainda veremos os desdobramentos dessa queda de braço.

A pergunta que fica é: qual o próximo estágio? Quando as instituições se auto-destroem, o que sobra? Quem pode parar esse jogo e ler novamente as regras aos participantes? Teoricamente, o Senado Federal tem esse papel, contudo, a maioria dos Senadores da República tem ações para serem julgadas no STF e são ameaçados com frequência sob pena de terem sentenças desfavoráveis (talvez até injustas) caso se manifestem contrário aos supremacistas.

Talvez você tenha estranhado o uso da palavra “supremacista”, uma vez que, até hoje, ela tem sido basicamente associada aos supremacistas brancos, racistas e idiotas que se consideravam uma raça superior. No entanto, o sentido da palavra “supremacismo” também se aplica a qualquer grupo de pessoas que se julga superior aos demais.

Nada define melhor o Supremo Tribunal Federal hoje do que o supremacismo, como podemos observar na discussão entre o Ministro André Mendonça e o Ministro Flávio Dino [5]. Na ocasião, o Ministro Flávio Dino se apresentou como um ser superior, que não poderia ser ofendido, sob pena de punir (quase que pessoalmente) o ofensor. Não se trata de que devamos ofender ninguém, mas o Ministro André Mendonça argumentou que um ministro pode ser ofendido como qualquer outra pessoa e que, se achar cabível, buscará os meios de reparação previstos na lei, assim como qualquer cidadão.

O Brasil segue por um caminho alarmante, caminhando para uma falência institucional, com a economia em bancarrota [6], enquanto o atual presidente participa de encontro de ditadores na Rússia e desfila pelo mundo envergonhando o Brasil, juntamente com sua esposa [7]. Não sabemos aonde essa estrada nos levará, mas uma coisa é certa: HOJE NO BRASIL O PODER NÃO EMANA DO POVO.

[1]  (32min em diante) https://www.youtube.com/watch?v=MoZKPMAR8E8

[2] https://www.brasilparalelo.com.br/artigos/o-que-e-a-cultura-woke

[3]  https://noticias.stf.jus.br/postsnoticias/stf-decide-que-escolas-devem-combater-discriminacao-por-genero-ou-orientacao-sexual/

[4] https://g1.globo.com/politica/noticia/2025/05/09/stf-tem-amioria-para-manter-acao-penal-contra-ramagem-por-tres-crimes-e-derruba-decisao-da-camara.ghtml

[5] https://www.cnnbrasil.com.br/politica/dino-e-mendonca-divergem-no-stf-nao-admito-que-me-chamem-de-ladrao/

[6] https://veja.abril.com.br/economia/projecoes-do-governo-apontam-vai-acabar-o-dinheiro-para-servicos-basicos-ja-em-2027/#google_vignette

[7] https://www.cnnbrasil.com.br/blogs/lourival-santanna/internacional/ida-ao-dia-da-vitoria-em-moscou-coloca-lula-ao-lado-de-lideres-autoritarios/

Aviso

As opiniões contidas nos artigos nem sempre representam as posições editoriais do Boletim da Liberdade, tampouco de seus editores.

plugins premium WordPress
Are you sure want to unlock this post?
Unlock left : 0
Are you sure want to cancel subscription?