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Uma Introdução à Mont Pelerin Society

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Por Leonardo Chagas*

O século XX vivenciou tempos de turbulência e incertezas, que colocaram à prova os fundamentos do liberalismo clássico. Após a Segunda Guerra Mundial e ainda com a Grande Depressão fresca na memória, a confiança nos princípios do governo limitado, do estado de direito e dos mercados livres e competitivos estava abalada.

Um crescente número de intelectuais, muitos deles acadêmicos, defendia uma intervenção governamental mais incisiva na esfera privada – principalmente na economia – como meio de assegurar a estabilidade social. Essa mudança de pensamento marcou um desvio significativo do conceito original de liberalismo nos EUA, distanciando-se de seus princípios originais do século XIX e passando a ser associado ao progressismo e às ideias intervencionistas.

Foi nesse momento que Friedrich A. Hayek, o respeitado economista austríaco e filósofo político, publicou “The Road to Serfdom” em 1944. Neste influente trabalho, Hayek argumentou que mesmo intervenções bem-intencionadas em assuntos privados, ainda que promovidas por governos democraticamente eleitos, poderiam levar a um aumento da centralização do poder e, consequentemente, a uma diminuição da liberdade individual. Ele previu que o caminho do intervencionismo levaria a futuras tiranias, tão prejudiciais quanto os regimes autoritários que o mundo lutava para superar.

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Hayek percebeu a necessidade de consolidar e revigorar os princípios do liberalismo clássico. Com isso em mente, em 1947, ele organizou um encontro no Mont Pelerin, na Suíça, reunindo 39 renomados liberais da Europa e dos EUA, incluindo Milton Friedman, George Stigler, Aaron Director, Ludwig von Mises, Leonard Read, Karl Popper e Wilhelm Ropke. Deste encontro surgiu a Mont Pelerin Society, entidade dedicada à preservação e propagação do liberalismo clássico.

Presidindo a sociedade até 1960, Hayek enfatizou que a organização não buscaria ação política direta, mas sim, a construção de uma filosofia de liberdade robusta para confrontar as ideologias dominantes. O objetivo era criar um programa político atraente e popular. A meta era engajar intelectuais de destaque na criação de um projeto político atraente para o público em geral.

A Mont Pelerin Society, desde então, se mantém como uma comunidade voluntária de indivíduos dedicados aos princípios de uma sociedade livre. Não tem sede central, nem pessoal remunerado permanente, nem publicações oficiais, exceto uma pequena newsletter trimestral. A sociedade não adota uma posição oficial sobre questões políticas, e sua influência é principalmente refletida pelo que seus membros, como indivíduos, escrevem, dizem e fazem.

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Os membros da Mont Pelerin Society concordam na essência do Estado mínimo, embora haja discordâncias sobre os limites exatos deste. Alguns membros veem o mercado como a solução para todos os problemas, enquanto outros defendem que o papel do governo deve ser limitado ao Night-watchman state – ou minarquismo, como conhecido aqui no Brasil -, fornecendo apenas defesa nacional, polícia e um judiciário. Questões como a política monetária e cambial são áreas de debate, variando entre os membros que defendem o retorno a um padrão estrito do ouro e aqueles que veem o ouro como um bem como qualquer outro.

No início do século XXI, a Sociedade cresceu para cerca de 500 membros espalhados pela América do Norte, Europa, América Central e do Sul, Hong Kong, Taiwan, Japão, Índia, Austrália, Nova Zelândia, África do Sul e Turquia. A adesão é estritamente por convite, após a recomendação de dois membros e aprovação do Conselho de Administração. Os membros incluem acadêmicos de diversas disciplinas, empresários, associados de instituições de pesquisa privadas, advogados, juízes, jornalistas e até mesmo alguns políticos.

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A Mont Pelerin Society hoje é amplamente respeitada, mesmo por aqueles que discordam de seus objetivos. Entre seus membros, oito ganharam o Prêmio Nobel de Ciências Econômicas: F. A. Hayek (1974), Milton Friedman (1976), George Stigler (1982), James Buchanan (1986), Maurice Allais (1988), Ronald Coase (1991), Gary Becker (1992) e Vernon Smith (2002).

Quando o comunismo desmoronou na União Soviética e na Europa Oriental, algo que Hayek pôde presenciar, o liberalismo clássico, que muitos consideravam obsoleto, encontrou novo fôlego. Muito desse renascer se deve a Hayek e à Sociedade Mont Pelerin, que não apenas mantiveram esses princípios vivos, mas também reacenderam sua relevância no cenário mundial.

*Leonardo Chagas é presidente do Instituto Atlantos, consultor de investimentos e bacharel em relações internacionais – UFRGS.

Milton Friedman (de casaco claro e com chapéu, no centro) com amigos em uma excursão durante o primeiro encontro da Sociedade Mont Pelerin em 1947.

Aviso

As opiniões contidas nos artigos nem sempre representam as posições editoriais do Boletim da Liberdade, tampouco de seus editores.

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