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O Monopólio da Virtude

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André Marchesi*

Atualmente, muitos grupos de pressão organizam-se para movimentar a opinião pública acerca de temas que definem por relevantes, e colocam seu ponto de vista como o ponto de vista ideal, que deve ser seguido por aqueles defensores da dita pauta. São paladinos da liberdade, tolerância e respeito à diversidade. Seremos livres, tolerados e respeitados se pensarmos da forma que eles pensam.

Sua estratégia maniqueísta pretensamente os faz incorporar o monopólio do bem, e todo aquele que discorda de algum ponto do modus operandi desses grupos incorpora automaticamente o mal. Seja o assunto em questão o desarmamento, seja o racismo, o ambientalismo, o feminismo: ou concorda-se com o ponto de vista em questão, ou aquele que discordar será automaticamente exposto, criticado e até mesmo “cancelado”.

Thomas Sowell já bem colocou: “Diversidade e pluralidade são termos que, justamente por englobarem de tudo, dispensam seus promovedores de explicar especificamente o que defendem. Há diversidade e pluralidade de gênero, de cor, de preferências sexuais, de renda, de inteligência, de etnia etc. Sendo assim, perguntar se aquelas instituições que promovem a diversidade 24 horas por dia e sete dias por semana apresentam melhores resultados do que as instituições que não dão a mínima para esses ‘pré-requisitos’ fará apenas com que você seja visto como um reacionário insensível, malicioso, racista, misógino e homofóbico”. A lista de adjetivos críticos aos maldosos que pensam diferente das verdades absolutas impostas é infinita. 

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Sowell considera essas pessoas que ignoram qualquer reflexão honesta sobre os temas em voga, em determinado momento, de tomados pela “tirania da visão”. Não há qualquer interesse por parte desses indivíduos em discutir logicamente meios de se alcançar fins, ou de aplicar experiência e métodos para descobrir a resposta a problemas sociais. Eles estão cobertos de boas intenções, portanto, pensam corretamente e confiscam para si as soluções de todas as dores do mundo. É a busca pela paz que exalta moralmente os “pacifistas”, e não quais métodos de fato a garantem. Mesmo que haja um abismo entre os fins defendidos e os realmente obtidos, não se poderá debater. Se comprovarmos por “A + B” que tiranias mundo afora, historicamente, desarmaram sua população, e populações desarmadas apresentaram maiores índices de violência, seremos taxados de selvagens, armamentistas, assassinos ou genocidas.

Outro caso que recorrentemente é pauta dos monopolistas dos fins nobres é o combate à pobreza. Os “defensores dos pobres” irão defender a intervenção estatal, a taxação dos ricos, a cotização de vagas para mulheres ou negros, dentre diversos fins que têm algum mérito, entretanto, precisam ser devidamente discutidos. Se um liberal apresentar evidências empíricas de que, onde houve maior desenvolvimento econômico em todo o mundo, durante todo o curso da história, foi onde o governo menos interveio, pronto: será taxado de insensível, despreparado e desprovido de preparo para arguir, pois não sabe o que é ter que pegar um ônibus às 5h da manhã em um ponto, ou viver com “x” reais ao dia. A desqualificação é a carta na manga do maniqueísta virtuoso para tentar vencer um debate. Como se o liberal desejasse mesmo a perpetuação da pobreza. Quanto maior a incapacidade de argumentação, tão maior será a desqualificação ao debatente.

O ser humano pensa muito em questão de intenções e causa e efeito. Por mais que tenha ocorrido uma redução nunca antes vista nos índices de pobreza mundial, nós, nem ninguém, viu isso objetivamente. Isso pois não houve um plano mundial orquestrado com tal fim. Como ocorreu pelo crescimento da produtividade, o processo da mão invisível e a ordem espontânea, as pessoas não conseguem enxergar isso. A mente humana não consegue computar a complexidade de variáveis múltiplas que ocorrem ao mesmo tempo, então tendemos a simplificar nossa visão.

Fato é que falar sobre um tema como “produtividade” pode causar bocejos ao leitor. Porém, foi ela a grande responsável pelo incremento de riqueza pelo qual passou o ser humano nos últimos duzentos anos. E não, aqui não estamos tratando daquela produtividade das aulas de cursos de Administração que passam o filme “Tempos Modernos”, de Chaplin, e trazem a exploração de classe como consequência do aumento de produção, apesar de tudo ter se tornado esse conflito classista: homens x mulheres, negros x brancos, heterossexuais x homossexuais. A produtividade muitas vezes é ofuscada por pessoas superbem intencionadas, porém, sem qualquer capacidade de raciocínio lógico. Ela não toca o coração das pessoas, mas é a saída para resolver a questão da pobreza. Mas é só levantar-se a ideia de aprimorar tecnologicamente os métodos de produção, que os defensores dos empregos alheios surgem empunhando a bandeira de quem eles consideram vítimas.

Recentemente, um projeto de lei do deputado Kim Kataguiri visava permitir postos de gasolina sem frentistas, como ocorre hoje na maioria dos países. Claramente, o autor tem por objetivo, com esse projeto, desprender pessoas de trabalhos menos produtivos. Qual não foi a surpresa quando ele foi acusado por certos políticos da esquerda virtuosa de querer exterminar empregos. Se seguirmos a lógica dessa crítica, deve-se também proibir tratores e inchadas e dar colher às pessoas, para que arem o campo, gerando assim mais empregos (mas evidentemente reduzindo produtividade). Certa lei econômica já expõe: as pessoas só podem serem remuneradas pela riqueza que produzem e pelo valor que geram. Não há autoridade que possa suprimir uma lei econômica. Pudesse haver, congelamentos de preços sempre impediriam a inflação, mas fato é que eles nunca funcionaram, pois essa intervenção estatal gera anomalias em todo o sistema produtivo e só represa um reajuste ainda maior quando os preços forem descongelados.

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Outra falácia defendida por políticos da esquerda é a taxação dos ricos. Será que se referem aos mais ricos que eles? Alexandra Ocasio-Cortez, política e ativista americana e ícone das pautas trabalhistas, desfilou recentemente com um vestido em que se liam esses dizeres. Ela tem remuneração US$ 174 mil anuais. Quanto de seus rendimentos ela aceitaria que fossem taxados? Na mesma linha, a deputada federal brasileira e Sâmia Bonfim, do PSOL, costuma criticar privilégios. Nem parece a deputada que apenas em 2021 já gastou R$ 960 mil em seu gabinete, 96% do disponibilizado, e que já recebeu mais de R$ 303 mil em salários no ano. Fazer caridade com o dinheiro dos outros é fácil!

Pensar que há um burocrata, em uma cadeira de Brasília, coberto de boas intenções, e pronto para utilizar o recurso subtraído violentamente de cada “contribuinte” (como se fosse voluntária a contribuição) de forma eficiente, é no mínimo ingênuo. Eis um fato para se pensar: o Estado não visa ao bem comum. Mas o que se faz é manipular semânticas para interferir na pragmática. Políticos aparentam um refinamento moral de agir e decidir sempre com as melhores das intenções sobre onde serão gastos os impostos extorquidos da população. Caso faltem impostos, não tem problema: imprime-se papel ao qual se atribui certo valor. A inflação gerada por esse ato, que afetará justo aqueles que julgam defender, os mais pobres e necessitados, tirando seu poder de compra, na maioria das vezes é desconsiderada. Ou taxa-se mais a sociedade, o que afetará mais pesadamente os mais pobres. O que importa não são as intenções? Como afirmou o ex-ministro do STF Ayres Britto, e que resume o pensamento de boa parte da elite política: “Os particulares primeiro precisam saber quanto vão ganhar para poder gastar. O Estado é diametralmente oposto: ele precisa saber quanto vai gastar para poder arrecadar. Não pode haver lei de teto ou congelamento de gastos. Principalmente ao tratar-se de matéria de direitos sociais e do encurtamento de distancias sociais”. Ah, o social novamente justificando qualquer loucura orçamentária!

Por fim, é evidente que não há apenas um lado certo. Mas, se o debate ruma para o lado menos progressista, então deve estar errado. Quando o progressismo perde, algo deve ser consertado. Criam-se neologismos e termos novos, portanto, deve-se regular “fake news”, “discursos de ódio”, “ataques a instituições” e “atos antidemocráticos”. Qualquer pessoa com um diploma julga ter mandato para interferir na vida alheia. Todo e qualquer fim nobre tem um dono – e, na cabeça deles, são os próprios. Aqueles que ousarem discordar ou questionar os meios defendidos para se chegar a esses nobres fins simplesmente não podem ser virtuosos. Caso contrário, os que aparentam nobreza ficarão nus, e, sem o manto da virtude, o que ficará à mostra é a sua essencial hipocrisia.

*Associado ao IEE.


Foto: Pixabay

Aviso

As opiniões contidas nos artigos nem sempre representam as posições editoriais do Boletim da Liberdade, tampouco de seus editores.

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