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Regime Militar conseguiu reduzir ações de inteligência de países comunistas no Brasil, avaliam pesquisadores

Boletim da Liberdade entrevistou com exclusividade os pesquisadores Vladimír Petrilák e Mauro Abranches Kraenski, autores do best-seller da Amazon "1964 - O Elo Perdido", que se debruça nos arquivos da StB
Regime militar durou 20 anos, mas teve início no dia 31 de março de 1964 (Foto: Acervo Público)
Vladimír Petrilák e Mauro “Abranches” Kraenski, autores do livro “1964 – O Elo Perdido” (Foto: Reprodução/Facebook)

A participação da União Soviética no Brasil, durante o período da Guerra Fria (1945-1991), é um tema muito pouco explorado pela historiografia acadêmica brasileira. Contudo, documentos oficiais recentes lançados ao público podem alterar todo o curso da história contada sobre o Brasil no período.

É o que relatam os pesquisadores Mauro Abranches Kraenski e Vladimír Petrilák, fundadores do think tank StB no Brasil. O instituto visa investigar de forma inédita as relações entre o bloco soviético e o Brasil a partir de os arquivos oficiais do serviço de inteligência da antiga Tchecoslováquia, o StB (sigla para “Segurança Estatal”), um dos braços da KGB russa.

Em estudo recentemente publicado no livro 1964 – O Elo Perdido (Vide Editorial, 2017), os pesquisadores verificaram descobertas surpreendentes sobre os bastidores da crise política brasileira que motivou a queda do presidente João Goulart e a intervenção militar de 1964.

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Baseados nos arquivos oficiais tchecos disponibilizados publicamente, a obra relata que a StB tcheca, submetida à KGB, atuou na América Latina durante a Guerra Fria, fornecendo suporte operacional, logístico e humano.

Sua principal função no Brasil dos anos 60 consistia em infiltrar-se em postos-chave estratégicos da administração pública e de estatais brasileiras, como Petrobras e BNDES, com o objetivo de manipular informações estratégicas para criar um clima social favorável à atividade revolucionária. Entre as atividades promovidas estiveram a falsificação de documentos para implicar os EUA no golpe de 64.  

Em entrevista inédita ao Boletim da Liberdade, os pesquisadores Mauro Abranches e Vladimir Petrilák, também autores do livro, detalham como foi realizado o projeto de pesquisa nos arquivos soviéticos.

Boletim da Liberdade: Como surgiu a iniciativa de desenvolver um projeto sobre o Brasil nos arquivos de Moscou?

Mauro Abranches Kraenski: Primeiramente é bom esclarecer que aqui se trata do Arquivo ABS (em tcheco: Archiv Bezpečnostních Složek – Arquivo dos Serviços de Segurança, órgão vinculado ao Instituto de Pesquisas de Regimes Totalitários – ÚSTR, em tcheco: Ústav pro Studium Totalitních Režimu ) que fica em Praga, na República Tcheca.

A iniciativa surgiu como uma curiosidade pessoal sobre o que se sabia no Brasil a respeito da presença e/ou atuação de serviços de inteligência de países do antigo bloco comunista no Brasil, levando em conta a existência de informações, comentários em redes sociais, publicações sobre a presença e atuação da CIA no Brasil, nos anos 60 por exemplo. A impressão que então se tinha era a de que somente a CIA operava no Brasil e que não havia nenhum serviço de inteligência comunista. 

Tanques de guerra se posicionam em avenida no Rio de Janeiro no dia 31 de março de 1964 (Foto: Acervo Púiblico)

Boletim da Liberdade: Por que o tema das relações entre Brasil e União Soviética é tão pouco estudado no meio acadêmico brasileiro?

Vladimír Petrilák: Infelizmente não estamos em condições de responder esta pergunta. Mas assim como já escrevemos anteriormente, esta falta de proporção em relação aos EUA é bastante visível.

Aqui podemos dizer que em nosso próximo livro, informaremos sobre um conhecido brasileiro (pseudônimo Honza) que nos anos 80 publicou um livro dedicado as relações diplomáticas entre Brasil e a URSS. Honza foi um agente da StB durante os anos 60 e depois do golpe de 64. Quando ele publicou esse livro, a StB no Brasil já não atuava. Mas não se pode excluir a possibilidade de que o antigo agente do serviço de inteligência checoslovaco tenha sido reaproveitado pelo serviço de inteligência de outro país do bloco soviético.

A impressão que então se tinha era a de que somente a CIA operava no Brasil e que não havia nenhum serviço de inteligência comunista.

Boletim da Liberdade: Os documentos descobertos e analisados no decorrer do projeto corresponderam ao esperado, ou surpreenderam?

Mauro Abranches KraenskiSurpreenderam, após descobrirmos que o serviço de inteligência checoslovaco comunista da StB no Brasil, havia sido tão ativo, que iniciou suas atividades no Brasil já desde o ano de 1952, que se desenvolveu ao ponto de ser capaz de realizar operações de influência tão grandes como por exemplo a operação Druzba (organizar o Congresso Continental de Solidariedade à Cuba, em 1963, em Niterói). O StB também foi capaz de recrutar várias pessoas como colaboradores conscientes e aproveitar de muitas outras como contatos ou colaboradores inconscientes, que foi capaz de se aproximar inclusive do gabinete do então presidente Goulart, entre outras coisas.

Aqui podemos também lembrar que a StB determinava objetos ou alvos de interesse, com o objetivo de entrar, infiltrar ou penetrar operacionalmente através de sua rede de agentes nos mesmos, para aquisição de informações ou materiais relacionados com determinadas tarefas. Entre os objetos de interesse relacionados com o Brasil, definidos nas pastas, podemos citar: Conselho de Desenvolvimento, situação política e econômica, situação sindical, BNDES, Serviço de informação americano, Congresso Nacional, Secretaria do Governo, Confederação Nacional da Indústria – CNI, Ministério das Relações Exteriores, Governo e Parlamento, instituições científicas, polícia e serviço de inteligência, partidos políticos, jornalistas, Petrobras, Conselho Nacional de Petróleo (CNP), Exército, Polícia Federal, contraespionagem e espionagem brasileira, organização do serviço de inteligência do Brasil e ministérios, Secretaria Nacional de Segurança, e vários outros assim chamados, “objetos de interesse”.

Como muitas dessas pastas foram destruídas, não tivemos condições de descobrir qual foi o grau de penetração ou volume de informações adquiridas em todos esses objetos de interesse citados acima. Mais detalhes descrevemos em nosso livro: 1964 — O elo perdidoO Brasil nos arquivos do serviço secreto comunista. Por outro lado, também foi uma surpresa para nós, saber que a StB não forneceu diretamente armamento para grupos de guerrilha no Brasil.

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Boletim da Liberdade: A que vocês atribuem o interesse soviético sobre o Brasil no período da Guerra Fria?

Mauro Abranches KraenskiA URSS, assim como seu serviço de inteligência KGB e os serviços de inteligência de outros países do antigo bloco soviético, sempre trataram os EUA como o inimigo principal, e atuaram em vários países com o objetivo de prejudicar os EUA, a imagem desse país, de comprometer e difamar a imagem do mesmo. E no Brasil, como o maior país da América Latina, foi o mesmo.

Boletim da Liberdade: Durante o período de instabilidade política e social no Brasil que culminaria no golpe militar, entre a renúncia de Jânio Quadros em 1961 e a deposição de Jango em março de 1964, houve algum conhecimento por parte dos militares e da inteligência brasileira sobre as atividades estrangeiras de espionagem do StB (serviço secreto tcheco)?

Vladimír Petrilák: Encontramos comentários em documentos de órgãos de inteligência brasileiros, (mas, depois do golpe de 1964) que o serviço de inteligência checoslovaco era um dos mais perigosos que atuava no território brasileiro.

Sabemos que em 1964 (após o golpe) houve a expulsão por parte dos militares de um diplomata checoslovaco por atividades consideradas como espionagem.  Temos também o caso de um agente brasileiro recrutado pela StB, de pseudônimo “LOBO”, onde o próprio denunciou a si mesmo para o DOPS em agosto de 1961, informando sobre seus contatos suspeitos com diplomatas tchecoslovacos. A polícia brasileira nada fez quanto a isso até o ano de 1964. Descrevemos detalhadamente este caso em nosso livro.

Menos de um mês após o golpe, Marechal Castelo Branco assume a presidência do Brasil (Foto: Acervo Púiblico)

Boletim da Liberdade: O livro comenta que houve uma redução das atividades de espionagem e inteligência da StB no regime militar (1964-1985). O que explicaria essa redução do envolvimento?

Vladimír PetrilákPrincipalmente uma clara posição anticomunista das novas autoridades brasileiras, que não era somente declarada, mas também teve o seu reflexo no trabalho dos órgãos de contra inteligência brasileiros.

Segundo os relatórios da StB, sabemos que a partir de abril de 64 a polícia brasileira passaria a observar com atenção as atividades dos diplomatas checoslovacos. Esse monitoramento trouxe para o Brasil o efeito desejado quanto a uma limitação significativa na eficácia destes diplomatas (não todos), que na realidade, trabalhavam para o serviço de inteligência.

Como já foi dito antes, uma grande parte da rede de agentes perdeu as suas possibilidades de influência em função dos atos institucionais militares, o que significava que, do ponto de vista da StB, eles perderam a sua utilidade. Sendo assim, do ponto de vista da segurança brasileira, da defesa contra influências comunistas e contra perigosa subversão, as atividades dos militares foi até certo ponto eficaz.  

Sendo assim, do ponto de vista da segurança brasileira, da defesa contra influências comunistas e contra perigosa subversão, as atividades dos militares foi até certo ponto eficaz.  

Boletim da Liberdade: Historiadores brasileiros tendem a destacar o papel da CIA no golpe de 64, em especial a Operação Brother Sam. Como vocês avaliam esta influência?

 Mauro Abranches Kraenski: O que podemos dizer é que, como os EUA eram considerados o inimigo principal dos governos comunistas dos países do antigo bloco soviético e por seus serviços de inteligência, estes tinham como um dos principais focos monitorar a influência e atuação dos EUA e da CIA nos diferentes países, também para descobrir seus eventuais planos e passos.

E segundo os documentos (especificamente uma análise da StB sobre os acontecimentos de 31 de março de 1964 no Brasil, enviado para o comitê central do partido comunista da Checoslováquia), a StB não detectou nenhuma participação direta dos americanos quanto ao 31 de março e para a StB isso também foi uma grande surpresa. É necessário aqui dizer que a StB não foi capaz de penetrar fortemente na questão que diz respeito as atividades da CIA no Brasil, ou seja, possuía poucas informações a respeito.

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Boletim da Liberdade: Declarações recentes do presidente da República buscam reabilitar o evento como parte do calendário histórico nacional. Na opinião de vocês, a intervenção militar de 1964 pode ser considerada um golpe? 

Vladimír PetrilákNão faz parte do nosso trabalho opinar sobre este assunto. A única coisa que podemos afirmar, é que, segundo nossas pesquisas, os acontecimentos de março de 64 prejudicaram brutalmente as atividades da StB no Brasil.  Houve inclusive um certo pânico por parte dos tchecos, sendo levado em conta a queima de documentos na rezidentura (base do serviço de inteligência).

Chegaram inclusive a praticamente paralisar por meses a atuação da StB, com a perda de contato com alguns agentes, colaboradores e com os chamados contatos legais e ilegais. Uma importantíssima operação em andamento foi interrompida. Ou seja, segundo os documentos o terreno se tornou bem mais difícil para o “trabalho” e a atuação da StB nunca mais foi a mesma do que antes de 1964.

Segundo informações dos documentos, sabemos que, além da StB, outros serviços de inteligência de países do antigo bloco soviético ou de outros países comunistas também atuavam no Brasil, como os cubanos e a própria KGB. A lógica nos faz crer que estes serviços secretos tiveram os mesmos problemas e certamente a atuação destes também deve ter sido prejudicada pelos acontecimentos de 31 de março de 1964 e pela mudança de regime.   

A lógica nos faz crer que estes serviços secretos tiveram os mesmos problemas e certamente a atuação destes também deve ter sido prejudicada pelos acontecimentos de 31 de março de 1964 e pela mudança de regime.   

Boletim da Liberdade: Em termos de considerações finais, como vocês avaliam o legado do comunismo soviético no mundo do século XX?

Vladimír PetrilákDois aspectos de legado do comunismo podem ser considerados:

O primeiro aspecto são as devastações causadas por essa ideologia criminosa nos países que os comunistas obtiveram o poder (geralmente com a ajuda de Moscou) e as nações que neles viviam e tiveram um duvidoso prazer de experimentar em sua própria pele o chamado socialismo real, que na prática traz miséria, humilhação e violação dos direitos de cidadania. Esses países, apesar de abandonarem o jugo do comunismo, ainda lutam contra as suas consequências, que se manifestam não apenas nas dificuldades de superar o absurdo econômico, que dominou mais de 40 anos nessa parte do mundo, mas principalmente na mentalidade dos cidadãos destes países, que ficaram marcados por algo que o filósofo católico polonês Józef Tischner chamou de “homo sovieticus”.

O homo sovieticus é, resumindo, um homem que foi escravizado pelo sistema comunista, um cliente do comunismo. O colunista polonês Jerzy Turowicz, por sua vez, definiu o “homo sovieticus” da seguinte maneira: O homo sovieticus é hoje uma pessoa que espera e exige tudo do estado, que não quer e não sabe tomar o seu destino em suas próprias mãos”. Esta herança do comunismo infelizmente continua viva e provavelmente não somente nos países pós-comunistas.

Sede da StB, antigo serviço de inteligência da Checoslováquia e ligado à KGB, que operou no Brasil dos anos 1960 (Foto: Wikimedia)

Como segundo aspecto do legado do comunismo, existe ainda o aspecto filosófico e a sua grande influência ilusória, como escreve François Furet, sobre intelectuais não apenas na França do pós-guerra, mas em todo o mundo, inclusive na América do Sul. E aqui, referindo-se à questão do homo sovieticus, devemos novamente afirmar que esse pensamento ilusório e envenenador da ideologia humana, que foi o comunismo, causou uma gigantesca devastação em todo o mundo – e essa confusão ainda continua viva. Hoje, manifesta-se ela em várias ideologias ou convicções bizarras, como por exemplo em movimentos ecológicos extremistas ou em uma busca contrária a lei natural, de diferentes ambientes para igualar os direitos das pessoas com uma orientação sexual diferente. Há um certo paradoxo nisso – o comunismo era muito puritano em sua essência (apesar do período, em sua origem, de desobediência moral logo após a Revolução de Outubro na Rússia) – hoje esses ambientes usam esse modo de pensar e agir para que suas convicções sejam ouvidas, que tem muito a ver com a dogmática usada pelos comunistas.

Esta pergunta é muito ampla, como podemos ver, ainda é necessário revelar os mecanismos do funcionamento do comunismo como tal, porque isso pode nos ajudar a se defender contra diferentes ideologias que aparentemente não são comunistas, mas que aproveitam bastante as ideias envenenadas do bolchevismo.

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