Déjà-vu? - Coluna

Déjà-vu?

12.05.2022 09:25

*Rodrigo Führ de Oliveira

Conta de luz, congelamento de preços e o futuro que não chega.

Um alerta vermelho foi acionado no fim de abril: em meio a pautas-bomba, o Congresso pode sustar revisões em tarifas de energia aprovadas pela ANEEL. No dia 19, após amplos estudos e discussões técnicas transparentes, a agência reguladora homologou a revisão dos preços praticados por concessionárias de distribuição de energia da região Nordeste. No dia seguinte, o deputado Domingos Neto (PSD/CE) apresentou projeto de decreto legislativo pretendendo sustar essa revisão (PDL 94/2022). O argumento é de que a população já está muito afetada pela inflação e não suporta mais aumentos. Diversos deputados correram para pedir coautoria.

A proposta consegue ser pior do que um simples congelamento de preços. É uma medida ilegal que, embrulhada em tons populistas, cria uma enorme dívida para a população, em vez de protegê-la.

Tentativas de frear a inflação a canetadas – às vésperas de pleitos eleitorais – não são novidade no Brasil. O fracasso dessas tentativas também não. Vemos, de tempos em tempos, medidas que lembram o Plano Cruzado. Proibir os preços de subirem por decreto pode até dar um pequeno alívio temporário, mas a conta chega logo ali na frente com desabastecimento, inflação e descontrole. Foi assim com Sarney em 1986, uma semana após as eleições. O mesmo ocorreu em 2015, quando as medidas de Dilma para reduzir a conta de luz se tornaram insustentáveis e as tarifas sofreram aumento médio de mais de 50%. Já não há exemplos suficientes?

Sustar a revisão das tarifas é medida que consegue a proeza de ser ainda pior, porque significa violar os contratos de concessão da distribuição de energia. Até os juristas mais estatistas e avessos à ideia de contrato administrativo reconhecem que o equilíbrio econômico-financeiro é a garantia mais fundamental das concessionárias e deve ser respeitada. Como a revisão periódica das tarifas é a principal ferramenta de equilíbrio, impedir sua aplicação por razões políticas dará, com toda a certeza, causa a indenizações futuras. E assim a conta volta com juros, multa e correção monetária para o bolso do cidadão.

Os deputados têm razão: a população está muito afetada pela inflação e não suporta mais aumentos. Mas suporta menos ainda medidas populistas que, em vez de resolver, só aprofundam os problemas. De estelionato eleitoral em estelionato eleitoral, o Brasil foi sendo hipotecado em graus crescentes. Essa visão de curtíssimo prazo põe a perder o futuro do país, que já arrisca nunca chegar.

É preciso uma mudança de rumos que traga seriedade, segurança e confiabilidade às instituições, sem invencionismos econômicos nem discursos vazios. Ainda temos seis meses até outubro. Ainda há esperança de sairmos desse déjà-vu.

*Rodrigo Führ de Oliveira é advogado e associado ao IEE.

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